segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Um Grande Estadista - Parte II

Por Michele Calliari Marchese

Comemorativo aos 51 anos da morte de Cel.Passos Maia


Havia geado na calçada naquela manhã e o termômetro pendurado na parede acusava -2,3º. Estava tão frio que não se arriscou em sair. Esperou a esposa preparar o café e numa concordância com a morte, tentou viver mais um restinho e desabafar tudo, para que ela não se esquecesse de contar aos netos quem tinha sido o avô deles. Que era para terem orgulho quando pronunciassem seu nome. Que não tinha feito as coisas em vão.

Contou numa voz rouca e ressentida sobre a surpresa ao saber do piquenique oferecido em sua homenagem no começo de 1921, foi uma demonstração de carinho do povo de Xanxerê e Passo Bormann que ele guardou em seu coração. Lembrou-se que tinha mais de 400 pessoas que ovacionaram seu nome ao vento, e então ele chorou.

Aceitou a candidatura para Superintendente Municipal de Chapecó, não admitia publicamente, mas ela era acalentada como a um bebê em noites suaves. Venceu em 1921. Conheceu homens corruptos e tratou de banir o banditismo exacerbado da região. Conheceu homens de índole irretocável e foi o grande articulador da visita de Abelardo Luz, filho de Hercilio Luz à região. Arranjou uma recepção de 500 cavaleiros em Goio-En para esperar tão influente autoridade. As festas foram lautas e lambeu os lábios cheios de açúcar da xícara de café. A esposa recordava de tudo muito bem, afinal, os festejos em honra a Abelardo Luz e consequentemente ao marido duraram uma semana.

O que mais o incomodava eram as trocas da Sede Municipal. Era uma briga entre as vilas de Passo Bormann e Xanxerê e que por fim, não ficou nem em um, nem em outro lugar e sim em Passos dos Índios. “Menos mal, acabou com a briga”.  Mas tinha sido deposto naquela ocasião. Quanta miséria aquela Revolução de 1930.

“Nessa época já morávamos em Joaçaba, lembra”? Disse-lhe a mulher para a confirmação da vida deles juntos.

Claro que lembrava. Lembrava-se de tudo, nos mínimos detalhes. De todos os telegramas, de todos os discursos, de todas as lutas. Tinha sido eleito prefeito de Joaçaba em 1926 e em seu governo construiu o primeiro Grupo Escolar que levou o seu nome, o edifício dos Correios e Telégrafos, o edifício da prefeitura e que ele soube que foi incendiado 15 anos depois. Foi uma tragédia sem precedentes. Era capaz de escutar os gritos da população em desespero.

A esposa comentou que naquela época eles tinham caminhado de casa em casa angariando fundos para a construção da Igreja Matriz e em contradição à esse ato ele comandou as forças do Quartel de Herval para o Levante Constitucionalista de 1932. Tudo em vão. Esse levante lhe rendeu uma prisão em Florianópolis, depois no Rio de Janeiro e dali seria mandado para o exterior.

Mas tinha amigos. E era a eles que devia o retorno são e salvo. Foi eleito novamente prefeito em Joaçaba, mas licenciou-se e repetiu a sentença dita na noite anterior. “A política que fiz, não existe mais.”

Abandonou a vida pública, a política e pensou em Santos Marinho, aquele seu primeiro adversário político de Passo Bormann, nos idos de 1921. Tinha morrido em franca decadência política justamente no ano em que se elegeu Superintendente. Não morreria como ele. Mas morreria esquecido.

Fechou os olhos para nunca mais abri-los em 16 de junho de 1962, mas ainda pôde ouvir o choro dos seus e as palavras da mulher em seu ouvido: “Você foi e sempre será um grande estadista.”

Conto de ficção.

Cel.Manoel dos Passos Maia nasceu em 25/12/1887 em Jaguarão - RS. E faleceu em 16/06/1962 em Curitiba-PR.
Eleito Superintendente de Chapecó em 1921.
Eleito Prefeito de Joaçaba em 1926 e 1935.
Eleito Deputado Federal em 1934.
Passos dos Índios é o atual município de Chapecó – SC.
Distrito de Cel Passos Maia (pertecente à Ponte Serrada-SC) em 1960 cuja emancipação em 1991 mudou o nome para Passos Maia.
Escola Municipal Cel.Passos Maia em Joaçaba – SC, atualmente com as atividades encerradas.
Rua Cel.Passos Maia em Xanxerê – SC
Rua Cel.Manoel dos Passos Maia em Chapecó - SC
Trajetória política de Cel. Manoel dos Passos Maia inspirada no Livro “Santos Marinho e Passos Maia: A política no velho Chapecó (1917-1931)” de Eli Maria Bellani. Agosto, 90. UNOESC. E no Livro: Cinquentenário de Joaçaba – Edição 1966, Prefeitura Municipal de Joaçaba –SC.

Agradeço a: Almir Felipetto (Joaçaba-SC), Luiz Carlos Becker (Chapecó-SC),  e Osmar P. Calliari (Xanxerê – SC). Sem eles esse conto não seria possível.




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