quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

A Caverna



Por Osmar Pedro Calliari*

Tio Antero, como todos já devem saber, apreciava pescarias e caçadas. O relato seguinte foi feito pelo próprio, muitos anos depois do ocorrido, e está aqui representado exatamente como contou. Vejamos: em uma de suas cinematográficas excursões pelo sertão, lá para as bandas de Cruzeiro, na década de 30, estando correndo atrás de seu cão de caça, que corria atrás da caça, viu preocupado seu cão desaparecer, não mata adentro, mas como que tragado pela terra. Aproximou-se do local e viu uma grande fenda, verdadeira cratera, porém não circular, mas longa. Aí que seu cão caíra, e ganindo, pedia socorro a uns 30 metros abaixo. Armou-se Antero de cordas e cipós, e desceu pela fenda. Então constatou que a fenda, na verdade, era a entrada de uma enorme caverna, que, inexplicavelmente, permanecia clara como lá em cima, mas não se distinguia a fonte da luz. Servo de seu espírito aventureiro, pôs-se a explorar tal gruta, tendo observado detritos e destroços de madeira e metal, e calculou, com toda razão, que ali poderia haver algum tesouro, ou dos espanhóis, dos jesuítas, dos incas, ou quem sabe de algum bandido qualquer. Mas para ele, tesouro é tesouro, e não lhe importava de quem fora. De repente, na parte mais interna da caverna surge um ser, mais alto que Antero, vestido até os pés, com um manto reto e claro, pés e mãos grandes e de aspecto benevolente, que não atinou se era homem ou mulher. Não se sabe qual dos dois ficou mais surpreso com a presença do outro. Destemido, inda mais quando de posse de sua trabuzana calibre 16, dois canos, Tio Antero entabulou conversação, e explicou o motivo de sua aparição ali. Ânimos serenados, o estranho falou como num murmúrio que aquele local era tipo uma oficina de consertos, e que a matriz terrena deles se localizava dentro da montanha do Kilimanjaro, na África. O estranho afirmou ainda que provinha de um planeta, distante, cujo nome não ficou gravado na memória de Antero, e que suas visitas à Terra eram para trazer conhecimento e tecnologia avançada aos humanos. Convidou ainda Tio Antero para visitar seu planeta, caso quisesse, cuja viagem não demoraria muito. Antero não quis, mesmo porque seu destemor não era para tanto, numa época em que a aeronáutica terrena estava apenas engatinhando. Nisso, com um zumbido de muitas abelhas, desce, pela cratera, uma nave circular feita com um metal claro e brilhante, que Antero deduziu ser do mesmo material da Winchester do Mexicano, um guarda do trem postal. Antero apertou sua arma, e estava disposto a travar batalha ali mesmo, em defesa própria e de toda humanidade, se bem que, pensou ele, boa parte dela não mereceria tal esforço, principalmente o Mexicano do trem postal. Porém, quem desembarcou da nave foi um ser bem menor que o primeiro, parecendo uma criança e muito amigável e gentil sorriu para o Tio. Ele não acreditava muito em anjos e demônios, mas não descartou a hipótese de que ali poderia estar presente um dos dois, ou os dois, pois talvez, depois daquele arranca rabo sideral no começo do mundo, eles tivessem selado uma paz eterna e os homens nem ficaram sabendo. Depois de ouvir e ver coisas que nunca antes tinha ouvido ou visto, Antero se dispôs a regressar ao seu acampamento, e os dois seres extraterrestres, após prometerem fazer novos contatos, num gesto amável e de poder, elevaram o embevecido Antero e seu cão até a superfície, sem auxílio de cordas, cipós, ou outro artefato. O resto do dia e durante a noite, o Tio, muito pasmo, ficou matutando sobre o acontecido, e nem se dava mais conta do motivo de estar naquelas paragens. No dia seguinte, bem cedo, foi correndo em direção à cratera, mas por mais que procurasse não conseguiu encontrá-la, e o solo estava tão normal que parecia nunca haver tido uma fenda naquele local. Até o seu misterioso desaparecimento, numa última aventura, Tio Antero se lamentava e se maldizia por não ter aceitado o convite de visitar aquele planeta. E quem duvida que os inexplicáveis agroglifos nos trigais não sejam tentativas de novos contatos com Tio Antero? Ou do Tio Antero conosco?



*Este e os demais contos da série "Histórias para sempre lembrar" foram escritos por Osmar Pedro Calliari, pai da nossa querida Michele Calliari Marchese. Ele partiu ainda muito cedo, deixando um vazio que jamais poderá ser preenchido. Publicar aqui alguns dos textos que ele deixou escritos é uma forma de homenageá-lo e tê-lo sempre presente, porque enquanto houver memória haverá vida, História e histórias para contar.




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